Por Alan Capriles
Desconfio que a passagem conhecida como "O Grande Julgamento das Nações" seja o texto menos pregado dos púlpitos evangélicos. Não estou me referindo ao relato do grande trono branco, que se encontra no livro do Apocalipse, pois esse é lembrado por muitos pregadores. Refiro-me ao texto do evangelho segundo Mateus, capítulo 25, no qual Jesus declara que "todas as nações serão reunidas em sua presença, e ele separará uns dos outros, como o pastor separa os cabritos da ovelhas." (Mt 25:32)
Desconfio que a passagem conhecida como "O Grande Julgamento das Nações" seja o texto menos pregado dos púlpitos evangélicos. Não estou me referindo ao relato do grande trono branco, que se encontra no livro do Apocalipse, pois esse é lembrado por muitos pregadores. Refiro-me ao texto do evangelho segundo Mateus, capítulo 25, no qual Jesus declara que "todas as nações serão reunidas em sua presença, e ele separará uns dos outros, como o pastor separa os cabritos da ovelhas." (Mt 25:32)
Suponho que a razão para que esse texto não seja pregado é sua desconcertante simplicidade. Nele, a salvação se descortina de uma forma totalmente livre de doutrinas teológicas. Para Jesus, os benditos do Pai não são necessariamente os religiosos, mas aqueles que deram comida ao faminto, água ao sedento, que hospedaram o forasteiro, que vestiram aquele que estava nu, que visitaram o enfermo e também o encarcerado. Esses, que praticaram o amor ao invés de tê-lo somente em palavras, são os que, surpresos, ouvirão do Rei naquele grande dia: "Foi a mim que fizestes." (Mt 25:40) No entanto, aqueles que se esquivaram de amar o próximo, ouvirão exatamente o contrário: "A mim deixastes de fazer". E por isso estes "irão para o castigo eterno, porém os justos, para a vida eterna." (Mt 25:46)
Para não dizer que nunca ouvi alguém pregar com base nesse texto, lembro-me de um pastor que tive, quando eu ainda era recém convertido. Não tenho boa memória, especialmente para mensagens que foram pregadas há mais de vinte anos, mas essa me marcou profundamente, não por ser uma bela pregação, mas pelo absurdo que foi dito. O pastor simplesmente "espiritualizou" o texto, dizendo que a fome não seria de comida, mas da palavra de Deus, que a sede não seria de água, mas do Espírito Santo, e assim por diante... Aquilo foi um choque pra mim. Especialmente porque eu mesmo havia lido aquele texto publicamente, poucos dias antes, num passeio que fiz com a juventude daquela igreja. Estávamos na Quinta da Boa Vista e o líder de jovens deu oportunidade para quem quisesse dizer alguma coisa, que podia ser um testemunho, ou a leitura de um texto. Sentindo meu jovem coração bater forte, e após já não conseguir mais resistir, levantei-me, com minha bíblia aberta no texto de Mateus 25:31-46. Não me lembro bem do que eu disse após a leitura, mas recordo que eu sentia um fogo arder dentro de mim. Essa era a primeira vez que eu pregava, ainda que tenha sido por poucos minutos. Duas senhoras, que passeavam pelo parque, se aproximaram para ouvir o que eu estava dizendo e me abordaram após a breve pregação. Elas sorriram e se limitaram a dizer: "Continue assim". Quando lhes perguntei de qual igreja eram, a resposta me surpreendeu: "Somos católicas, mas continue assim; não pregue religião, pregue o que Jesus ensinou." Aquilo me marcou profundamente. Talvez tenha sido a primeira vez em que desconfiei haver uma distinção entre o ensino do cristianismo e o ensino de Cristo.
Mas o que me trouxe tais recordações foi a recente pregação de um famoso pastor, que também procurou reinterpretar esse texto. Ao invés de espiritualizá-lo, como havia feito aquele pastor anos atrás, esse famoso pregador fez o contrário: "literalizou" o texto ao extremo. Segundo ele, nós não estamos prestando atenção num pequeno detalhe, que seria a palavra "irmãos", que só aparece no versículo 40:
"O Rei, respondendo, lhes dirá: Em verdade vos afirmo que, sempre que o fizestes a um destes meu pequeninos irmãos, a mim o fizestes."
Esse conceituado pastor, que pregou essa mensagem num caro congresso, ensinou que somente aquilo que fazemos para cristãos (ou seja, irmãos) é que será recompensado por Deus. A mensagem subliminar que ele estava ensinando, ainda que ele não tenha se dado conta disso, é a seguinte: "Não se importe muito em ajudar quem não é cristão, pois Jesus não tem qualquer empatia por eles e você não receberá recompensa alguma por isso." Apesar dele não ter dito com essas palavras, a conclusão não pode ser diferente.... Afinal de contas, por que outra razão ele tocaria no detalhe da palavra "irmãos"?
Devemos evitar a tentação de julgar o homem. Não temos esse direito e não é o que farei aqui. Ademais, tenho grande estima por este pregador e tenho sido edificado por muitas de suas mensagens. Todavia, por mais que admiremos alguém, temos o dever de examinar seus ensinamentos, conferindo qualquer doutrina com aquilo que o próprio Jesus ensinou. Sendo assim, precisamos responder a seguinte questão:
"Estaria Jesus ensinando que só devemos ajudar os irmãos da mesma fé e que não há recompensa divina para quem ajuda incrédulos?"
Não precisamos ir muito longe para encontrarmos a resposta. O próprio texto já nos dá a primeira pista. Ainda que Jesus tenha dito a palavra "irmãos" para os que são salvos, observe que essa palavra não é repetida em sua frase de condenação:
"Em verdade vos digo que, sempre que o deixastes de fazer a um destes mais pequeninos, a mim o deixastes de fazer." (Mt 25:45) Não aparece a palavra "irmãos" nesse trecho do que Jesus ensinou.
Sendo assim, se quisermos ser literalistas, levando ao extremo a presença da palavra "irmãos" no versículo 40 e sua ausência no versículo 45, a conclusão inevitável será esta: "Toda vez que fazemos o bem a qualquer cristão, foi a Jesus que fizemos (v.40). E toda vez que deixamos de fazer o bem a qualquer pessoa, seja cristã ou não, foi também a Jesus que deixamos de fazer (v.45)."
O problema é que o pregador não mencionou a ausência da palavra "irmãos" no versículo 45. Mas, mesmo que ele o tivesse feito, sua conclusão não estaria de todo correta. Em parte alguma dos evangelhos encontraremos Jesus dizendo que só haverá recompensa para o auxílio prestado somente a irmãos. Muito pelo contrário! Quando examinamos o que Jesus disse, nos deparamos com algo totalmente oposto a isso:
"Se amais os que vos amam, qual é a vossa recompensa?
Porque até os pecadores amam aos que os amam.
Se fizerdes o bem aos que vos fazem o bem, qual é a vossa recompensa?
Até os pecadores fazem isso.
E, se emprestais àqueles de quem esperais receber, qual é a vossa recompensa?
Também os pecadores emprestam aos pecadores, para receberem outro tanto.
Amai, porém, os vossos inimigos, fazei o bem e emprestai, sem esperar nenhuma paga;
será grande o vosso galardão, e sereis filhos do Altíssimo.
Pois ele é benigno até para com os ingratos e maus.
Sede misericordiosos, como também é misericordioso vosso Pai."
(Lucas 6:32-36)
Você percebe? A recompensa só está garantida quando amamos e fazemos o bem justamente àqueles que não merecem! Por isso é que ficarão surpresos aqueles que ouvirão o Rei dizer "Foi a mim que fizestes", pois eles não esperavam por isso. Eles não esperavam que o Senhor dissesse que aqueles famintos e miseráveis também eram seus irmãos. Isso nos faz lembrar da parábola do filho pródigo, quando o filho mais velho precisou ser lembrado pelo pai de que aquele pecador que retornava ainda era seu irmão. Um irmão que estava morto e reviveu, que estava perdido e foi achado. Mas, ainda assim, seu irmão. Sempre seu irmão. (Lc 15:32)
A simples verdade é que devemos ser misericordiosos com todos, e não somente com nossos irmãos de fé. Somente a prática deste amor incondicional é que nos torna verdadeiros filhos de Deus (Mt 5:44-48). Essa é a verdade. Uma verdade incômoda para os acomodados da religião, mas é a verdade. O resto... O resto é a teologia de quem fala muito, mas ama pouco.
"Estaria Jesus ensinando que só devemos ajudar os irmãos da mesma fé e que não há recompensa divina para quem ajuda incrédulos?"
Não precisamos ir muito longe para encontrarmos a resposta. O próprio texto já nos dá a primeira pista. Ainda que Jesus tenha dito a palavra "irmãos" para os que são salvos, observe que essa palavra não é repetida em sua frase de condenação:
"Em verdade vos digo que, sempre que o deixastes de fazer a um destes mais pequeninos, a mim o deixastes de fazer." (Mt 25:45) Não aparece a palavra "irmãos" nesse trecho do que Jesus ensinou.
Sendo assim, se quisermos ser literalistas, levando ao extremo a presença da palavra "irmãos" no versículo 40 e sua ausência no versículo 45, a conclusão inevitável será esta: "Toda vez que fazemos o bem a qualquer cristão, foi a Jesus que fizemos (v.40). E toda vez que deixamos de fazer o bem a qualquer pessoa, seja cristã ou não, foi também a Jesus que deixamos de fazer (v.45)."
O problema é que o pregador não mencionou a ausência da palavra "irmãos" no versículo 45. Mas, mesmo que ele o tivesse feito, sua conclusão não estaria de todo correta. Em parte alguma dos evangelhos encontraremos Jesus dizendo que só haverá recompensa para o auxílio prestado somente a irmãos. Muito pelo contrário! Quando examinamos o que Jesus disse, nos deparamos com algo totalmente oposto a isso:
"Se amais os que vos amam, qual é a vossa recompensa?
Porque até os pecadores amam aos que os amam.
Se fizerdes o bem aos que vos fazem o bem, qual é a vossa recompensa?
Até os pecadores fazem isso.
E, se emprestais àqueles de quem esperais receber, qual é a vossa recompensa?
Também os pecadores emprestam aos pecadores, para receberem outro tanto.
Amai, porém, os vossos inimigos, fazei o bem e emprestai, sem esperar nenhuma paga;
será grande o vosso galardão, e sereis filhos do Altíssimo.
Pois ele é benigno até para com os ingratos e maus.
Sede misericordiosos, como também é misericordioso vosso Pai."
(Lucas 6:32-36)
Você percebe? A recompensa só está garantida quando amamos e fazemos o bem justamente àqueles que não merecem! Por isso é que ficarão surpresos aqueles que ouvirão o Rei dizer "Foi a mim que fizestes", pois eles não esperavam por isso. Eles não esperavam que o Senhor dissesse que aqueles famintos e miseráveis também eram seus irmãos. Isso nos faz lembrar da parábola do filho pródigo, quando o filho mais velho precisou ser lembrado pelo pai de que aquele pecador que retornava ainda era seu irmão. Um irmão que estava morto e reviveu, que estava perdido e foi achado. Mas, ainda assim, seu irmão. Sempre seu irmão. (Lc 15:32)
A simples verdade é que devemos ser misericordiosos com todos, e não somente com nossos irmãos de fé. Somente a prática deste amor incondicional é que nos torna verdadeiros filhos de Deus (Mt 5:44-48). Essa é a verdade. Uma verdade incômoda para os acomodados da religião, mas é a verdade. O resto... O resto é a teologia de quem fala muito, mas ama pouco.
Alan Capriles
sexta-feira, 12 de outubro de 2012
QUAL O SENTIDO DA VIDA?
Por Alan Capriles
Tanto por seus ensinamentos, quanto por seu exemplo, Jesus deixou bastante claro que a vida não consiste em "ter", mas a vida consiste em "ser". Não o "ser cheio de si mesmo", mas exatamente o contrário: devemos renunciar a nós mesmos para que sejamos cheios da presença de Deus.
Sendo assim, o sentido da vida não está no acúmulo de bens, ou na conquista de fama e poder. Nenhuma destas coisas é o foco da nossa existência. O sentido da vida consiste em sermos transformados a cada dia, trocando atitudes destrutivas (tais como egoísmo, orgulho, inveja, intolerância) pela prática de valores espirituais, divinos e eternos (tais como a solidariedade, a simplicidade, o perdão, a honestidade, o amor).
A salvação da qual Jesus falava não é outra coisa senão você ser salvo de si mesmo. Quem não deixa de ser um diabo nesta vida não deveria esperar pelo céu após a morte.
Por conseguinte, quem compreende e pratica o que Cristo ensinou (independente de religião) já passou da morte para a verdadeira vida, havendo despertado para sua real filiação divina. Quem herdará o reino celestial, senão aquele que acumula virtudes, ao invés de bens materiais, que conquista a si mesmo, ao invés de fama e poder?
Portanto, quem vive pelo ser, e não pelo ter, é um bem-aventurado que já está vivendo no céu, ainda que caminhe sobre a face da terra.
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